terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Memória FC: Glórias roubadas (as mentiras sobre a Seleção de 1994)

A Seleção de 1982 tem muito a ver com aquela que, três Copas mais tarde, conquistou o tetracampeonato nos Estados Unidos. Calma, não falo de aspectos técnicos ou táticos, mas destino. Se a craques do quilate de Zico, Sócrates, Falcão, Cerezo, Leandro e Júnior, os deuses do futebol reservaram os louros de uma queda tão romântica quanto trágica, aos homens de Parreira nada restou além de uma vitória com glórias roubadas.

O receituário de frases feitas sugere que alguns triunfos resultam em reveses irrecuperáveis; em contrapartida, há derrotas que se configuram em incontestáveis vitórias. Se na Espanha o título não veio, ficou o legado do futebol genuinamente brasileiro. No fim das contas, uma redenção no DNA de um dos mais trágicos capítulos da história do futebol nacional, o Maracanazzo de uma geração. Já do tetra na terra de Hemingway, nada restou. É tratado ainda hoje como um filho bastardo, impuro, não merecedor de reconhecimento. Os tolos que o fazem não conseguem entender que a Copa de 1994 foi uma conquista de homens.

Em 1994, o futebol brasileiro já havia caído em descrédito devido a insucessos e times que não convenceram. Há 24 anos não ganhávamos uma Copa do Mundo, sequer ameaçávamos ganhá-la. Durante mais de duas décadas, todas as Seleções que partiam rumo a um Mundial conviviam com o fantasma do Tri, no México. Era peso demais. O futebol apresentado por Pelé e companhia foi sobrenatural , inigualável . Além disso, os homens de Parreira lutavam contra um país inteiro, contra sua própria nação. Era vencer ou vencer para não ser jogado aos leões na volta pra casa.

Durante o Mundial dos EUA, a Seleção foi massacrada por grande parte da imprensa. O programa Apito Final, exibido pela rede Bandeirantes, concentrava o maior número de detratores da equipe brasileira, como Juarez Suares, Mário Sergio, Luciano do Valle e Datena. As críticas eram carregadas de ranços pessoais. A impressão era de que todos ao redor da mesa estavam ali apenas esperando o fracasso da Seleção para mais uma vez desfilarem os seus achismos infalíveis e as suas verdades perfeitas.




Dunga jogou o fino da bola contra Camarões

Mário Sergio dizia que Dunga estava velho, que o Brasil sempre entraria com um a menos em campo se Dunga fosse titular. A história provou que o Vesgo estava errado: Dunga foi o maior ladrão de bolas daquela Copa e, no jogo contra Camarões, cansou de fazer lançamentos de três dedos (um deles, resultando em gol). No gol de Márcio Santos, o capitão inicia a jogada olhando para um lado e metendo a bola do outro (ironicamente, um lance que sempre caracterizou Mário Sérgio e, depois, Ronaldinho Gaúcho). A verdade do comentarista metido a estrategista veio alguns anos depois: Mário Sergio foi "saído" da Bandeirantes após fazer críticas a Dunga, então contratado para fazer parte do time de comentaristas da emissora.

Juarez Soares após o jogo contra os EUA teve de "esclarecer" algumas críticas feitas por companheiros de profissão de outros veículos, que disseram que o velho China, após o sofrido gol brasileiro, deu um murro na bancada de imprensa e ficou de cara amarrada até o apito final. Passou a impressão de que torcia por um insucesso da Seleção. As críticas foram prontamente rechaçadas pelo comentarista, que se defendeu afirmando que o gesto foi apenas um desabafo. Alguns anos depois, após ficar quietinho durante os festejos do título, Juarez Soares voltou a atacar a equipe de 1994, afirmando que, na verdade, a Itália perdeu o título.

O rancor em rede nacional não deu às caras somente na emissora dos Saad. No SBT, o narrador Luiz Alfredo foi protagonista de um dos momentos mais constrangedores da televisão, na mesa-redonda do canal do Homem do Baú. Confundindo opinião com falta de respeito, Alfredo falou uma série de impropérios de Zagallo, diante de um Carlos Alberto Torres, que permaneceu calado, sem uma única palavra em defesa de seu ex-técnico, que, naquela Copa, já era um senhor de idade.




A bomba santa de Branco calou os críticos

Não foram somente Dunga e Zagallo os maiores criticados naquela campanha. Branco e Taffarel foram atacados sem dó. Hoje, não dá para imaginar a vitória sem esses jogadores na campanha. Mário Sergio, quando Branco teve de substituir Leonardo, no jogo contra a Holanda, afirmava que o veterano lateral tomaria um sufoco do jovem ponta holandês Marc Overmars. Naquela partida, Branco marcou muito bem Overmars e ainda cavou a falta que deu origem ao seu golaço dando um "pescoção" no holandês. Uma vitória que teve de ser engolida a seco.

Por outro lado, Mazinho e Raí, queridinhos dos críticos da Bandeirantes decepcionaram naquela Copa. Mazinho, por sinal, foi protagonista de lances bisonhos, como furadas de bola absurdas. Os únicos poupados eram Bebeto e Romário. Entretanto, quatro anos depois, Bebeto foi vítima dos mesmos especialistas que tentavam convencer um país inteiro que Denilson deveria entrar no seu lugar no time titular.

Não cabe aqui analisar todos os jogos da Seleção na campanha do Tetra. Seria desonestidade ou atestado de insanidade dizer que aquela equipe jogou um futebol refinado. A Argentina de Maradona foi uma mentira. Goleou uma Grécia indigente e passou sufoco contra a inexperiente Nigéria. Depois, deitaram em cima do doping de Maradona para fantasiarem mais um título perdido. A verdade é que, mesmo com as glórias roubadas, mesmo com a final nos pênaltis, não houve outra equipe naquele Mundial que tenha apresentado melhor jogo. Tanto em 1982 quanto em 1994, as seleções carregarão para sempre o espectro da injustiça.

Um comentário:

Anônimo disse...

Já reparou que isso acontece em todas as copas, a insanidade da imprensa de São Paulo não foi somente naquele momento. Remeta a copa de 50 quando a seleção brasileira jogou contra a Suiça com um time composto só com jogadores paulistas e em 1970 em um amistoso contra a Argentina, o jogador Paulo César Caju foi massacrado no Morumbi na derrota de 2 x 0. Enfim, existe muito ranço por parte dos coleguinhas da outra ponta da Via Dutra. Aqui regionalmente perceba a cobertura feita nos programas esportivos de domingo, as chamadas mesas-redondas desancam os times do resto do Brasil, só existem Coríntihans, Palmeiras e São Paulo. Nem o Santos merece consideração.